quinta-feira, 10 de julho de 2008

Maria Full of Grace



Maria Full Of Grace é uma obra que penetra numa realidade dura de encarar e de aceitar. Ver estas jovens, apenas representações desesperadas de milhares e milhares de outras que sacrificam a vida na perspectiva de um futuro melhor e mais digno, para elas impossível de alcançar por outro meio, é aterrador na sua crua figuração dramática de algo que continuamos a ignorar voluntariamente. Na sua primeira obra, Joshua Marston não só apresenta uma fulgurante estreia em cinema, realização e argumento que possui uma ténue índole de cariz teológico, já muito premiada inclusive nos Festivais de Berlim e Sundance, como também deixa a promessa de um futuro brilhante.
Maria (
Catalina Sandino Moreno) de 17 anos vive numa casa pequena na Colômbia. É jovem e bela, com um fogo que alumia a sua entidade e quando descobre a sua gravidez não fica nada surpreendida com a reacção do seu infrutuoso namorado Juan (Wilson Guerrero). Enfastiada pela monotonia da vila decide trilhar um destino melhor para a sua vida. Ela despede-se do seu emprego e ruma cheia de sonhos para Bogotá com um homem que a convence a fazer bom dinheiro como “mula” (Transportando doses de cocaína no seu estômago até Nova Iorque)
Maria vê-se assim explorada pelo mundo da droga, levando consigo a sua melhor amiga Blanca (
Yenny Paola Vega) e ambas recebem conselhos de Lucy (Guilied Lopez). Ela e Lucy escapam na alfândega apesar de suspeitarem delas, pois como estão grávidas não lhes podem passar a raio-X, Maria é levada para o perigoso e implacável mundo do tráfico de droga numa missão de sobrevivência, que ela terá de cumprir para abraçar os seus sonhos.
Joshua Marston filma todo este trajecto com particular intensidade, com destaque para as autênticas cenas de suspense no avião e no terminal de aeroporto. No entanto, os episódios ambientados nos EUA oferecem cenários não menos inquietantes, à medida que Maria se apercebe que as dificuldades não são automaticamente ultrapassadas na "terra das oportunidades".
Este é um filme sobre droga sem as habituais metralhadoras e perseguições alucinantes, sem aquelas estrelas célebres e efeitos visuais estonteantes. Ele foca-se no lado humano deste tema. É um filme que aceita e percebe a pobreza sem entrar numa de romantizar ou adornar o assunto. E realmente mostra-nos que o mal também surge por culpa de organizações, neste caso sistemas económicos.
A interpretação de
Catalina Sandino Moreno é sublime. É uma carismática actriz que arrecada a nossa simpatia através da inocência e medo que irradia na sua face. Através do seu olhar exibe uma subtil tristeza cravada no âmago espiritual da sua personagem.
Maria Full Of Grace é soberbo por múltiplas e diversas razões, inclusive pelo seu controverso título e cartaz. É um perspicaz murro no estômago das pessoas que têm o prazer de o contemplar. Cria no espectador uma claustrofobia e tensão brutal, especialmente quando visionamos o acto de ingestão das doses e nos apercebemos que se os frágeis receptáculos rebentarem o seu portador morre imediatamente de overdose. O filme expele vida autêntica em todas as suas vertentes, numa atmosfera verosímil mostra-nos motivos e resoluções reais de personagens plausíveis.
O filme é uma envolvente obra indie com múltiplas cenas de antologia que insistem em permanecer no espectador, proporcionando uma experiência cinematográfica que, apesar de difícil digestão a espaços, é honesta, sufocante e memorável como poucas.

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